2º Nota – Os efeitos da Pandemia do Coronavírus e as tarefas de luta da classe trabalhadora

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Os efeitos da Pandemia do Coronavírus e as tarefas de luta da classe trabalhadora – 2ª nota às centrais sindicais, às organizações dos trabalhadores, aos movimentos sociais e aos coletivos.

Nota_Conjuntura_Covid-19

A Pandemia do Coronavírus está relacionada a inúmeros fatores sociais e ambientais inter-relacionados que refletem a dinâmica global da Economia e do Estado capitalistas. Assim, uma análise de conjuntura não pode desconsiderar os conflitos entre os trabalhadores e os patrões e a cúpula de Estado como estruturantes, e como ganham dimensões diferenciadas de acordo com a posição de cada Estado-Nação no jogo das relações internacionais que dividem o mundo entre colonizadores e colonizados, dominantes e dominados. Sendo necessário também pensar como os aspectos macrossociais se articulam com as dimensões coadjuvantes para se construir uma leitura da classe trabalhadora sobre os efeitos que a pandemia da COVID-19 provocará nas atuais formas societárias.

Começando pelos fatores ambientais, destaca-se o modelo de produção de mercadorias que, associado às consequências mais imediatas por ele provocadas, como, por exemplo, o desmatamento, à urbanização e à industrialização desenfreada, tem não só destruído habitats inúmeras espécies, como também gerado várias contradições sociais atingindo principalmente a classe trabalhadora, em especial às populações mais vulneráveis submetidas a condições de vida deploráveis, podendo falar de um racismo ambiental.

A crise ambiental é o reflexo do controle sobre a natureza, o trabalhador, o lucro e as riquezas, e de como isso se configura num domínio do capital sobre as fontes de energéticas e naturais, incluindo nisso a produção de alimentos por grandes oligopólios econômicos. Podemos citar mais especificamente o sistema de criação industrial de alimentos, que Sonia Shah já nos alertou, e que pode ser aqui resumido nessa frase: “centenas de milhares de animais amontoados uns sobre os outros, à espera de ir para o matadouro: eis as condições ideais para que os micróbios se transformem em agentes patogênicos mortais” (Contra a pandemia, ecologia por Edição 152 Le Monde Diplomatique).

Ainda sobre esse fator, é necessário mencionar o papel político da ciência e das tecnologias a favor do capital que podem ocasionar diferentes riscos e efeitos nocivos à saúde da humanidade, quando se lançam na produção de experimentos novos e farmacológicos para aumentar a produção de alimentos e permitir o controle sobre fatores epidemiológicos, que incluem a manipulação de micro-organismos patogênicos e o seu intercâmbio entre os países centrais. Ao mesmo tempo, romper com a lógica da eventualidade atribuída aos ciclos pandêmicos e epidêmicos que não são raros ao longo do século XX (gripe espanhola em 1918; gripe asiática em 1957; gripe de Hong Kong em 1968) e só nas primeiras duas décadas do século XXI já ocorreram a Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS) (2002-2003), Gripe A (H1N1) (2009-2010), síndrome respiratória do Oriente Médio (MERS) na Arábia Saudita (2012-2013), Ebola na África Ocidental (2013-2016) e o novo Coronavírus (Covid-19).

No Brasil, no dia 02 de maio, já eram contabilizados 101.147 casos de infecção e 7.025 mortes, entretanto, estudos como capitaneados pela Universidade Federal de Pelotas, no RS, tem mostrado um grande número de subnotificação. A queda no isolamento social notado nas últimas semanas pela ação de empresários e políticos, principalmente ligado a Bolsonaro, agrava ainda mais a situação.

Os fatores sociais estão relacionados aos efeitos da lógica de exploração econômica, como a concentração de renda por um lado e a extrema desigualdade social de outro lado. A concentração urbana e a expulsão de camponeses para as favelas e periferias das cidades.  O desemprego e a precarização das condições de trabalho que expulsam os trabalhadores das redes de proteção social como, do acesso a aposentaria, ao seguro desemprego e ao auxílio doença, e ainda de uma renda regular. As condições de saúde, alimentares e de moradia a que são submetidos esses trabalhadores. Em contraposição, ainda há uma minoria que tem o mínimo, salários capazes de garantir a sua reprodução e da sua família e a garantia de uma seguridade. Ainda que a tendência seja a perda gradativa em longo prazo desses direitos, engrossando as fileiras da nova classe trabalhadora, o precariado.

A pandemia provocou a paralisação parcial da produção e distribuição de mercadorias em escala global, ocasionando uma queda da acumulação que não afeta de forma igual às frações da burguesia. Podemos dizer que os mais atingidos são os setores de serviços, comércios e indústria de transformação: por exemplo, turismo, entretenimento, lazer, shopping centers, bares, restaurantes, companhia áreas, transportes interestaduais, têxtil/vestuário/acessório, automotivo, eletro e eletrônicos. Já os setores considerados essenciais ligados à produção, distribuição e ao consumo de gêneros alimentícios, higiênicos, farmacêutico-hospitalares, aos serviços de segurança e hospitalares, aos transportes urbanos, aos de tecnologias e aplicativos e ao sistema financeiro terão os seus lucros garantidos, além de serem beneficiados com desonerações fiscais e subsídios estatais.

Os trabalhadores dos setores econômicos mais atingidos estão diante da realidade de redução de salários e de perda do emprego, enquanto aqueles que trabalham nos serviços classificados como essenciais (trabalhadores de farmácias, supermercados, de tecnologias, aplicativos e software como Uber, 99, iFood e Rappi, dos serviços de saúde e do transporte urbano) estão sendo mais explorados, em tempos de crise, quando submetidos à jornadas mais intensas de trabalho e aos baixos salários e aos riscos de contágio devido à exposição e ausência de equipamentos de segurança que os seus patrões, em grande maioria, se negam a fornecer. Além disso, a crise atinge de forma significativa os trabalhadores informais e autônomos que estão excluídos do sistema de produção e da rede de proteção social.

No contexto atual, a pandemia não representa por ora um colapso da economia nem dos estados capitalistas e suas políticas neoliberais. Embora seja notório que, se acaso os Estados e a burguesia não revertessem suas políticas de austeridades que levaram ao descaso com a saúde pública e com as demais medidas de proteção social, uma pandemia com as características atuais (altamente contagiosa, alta letalidade, sem vacina, protocolo de cura e exigência de tratamento intensivo) poderia em longo prazo provocar um colapso da economia e das formas atuais de organização social, que associadas às revoltas populares, não seria desejável para a classe dominante e a sua estrutura de exploração e concentração de riquezas. Numa quase orquestração perfeita, a economia é parcialmente paralisada pelos Estados, com aval da burguesia, que passa a promover “ações de socorro como os planos de recuperação pós-guerra”. O plano não é tão perfeito quanto parece e as fissuras estão presentes para todos verem, manifestando-se em dicotomias entre isolamento vertical e horizontal, dentre tantos absurdos ditos e feitos cuja lógica mais extrema é a do descarte de gente de forma imediata e de desrespeitos às orientações das organizações sanitárias. Por outro lado, a burguesia já prepara o avanço de novas formas de organização do trabalho a partir do uso de tecnologia da informação, sem de fato alterar o verdadeiro problema da pandemia: o sistema que vivemos.

Essa crise tem representado, em especial nos países como o Brasil, um aprofundamento da exploração e das situações de precariedade que a classe trabalhadora já vinha sendo submetida, e agora se acentuam através do desemprego e das medidas de “socorro à economia” que são nada mais que a ampliação da reforma trabalhista e da quebra da rede de proteção social do trabalhador, quando permite a redução de salário e jornada e a quebra do contrato de trabalho. As medidas de transferências de renda aos mais pobres e investimento público na saúde pública não podem ser confundidas como um retorno ao Estado provedor. As possibilidades pós-pandemia poderão se materializar em mais recessão e na perda acelerada de diretos e proteção social, seguidas dos diversos efeitos que um contexto como esse provoca: mais fome, pobreza, violência social e estatal.

No caso do Brasil, estamos numa posição de colonizados e subservientes, agravada pelo fato de as relações entre as diferentes classes sociais aparecerem emaranhadas à política do favoritismo, pessoalismo, individualismo e da conciliação, que desfavorecem a organização coletiva da classe trabalhadora e o despertar de uma consciência classe que vise à ruptura com os modelos hegemônicos de pensar e fazer política, isto é, anti-sistêmica e anticapitalista. Os conflitos de origens raciais e patriarcais presentes na divisão entre a casa grande e senzala estão presentes nos dias atuais e se transportam para as relações entre trabalhadores e patrões e entre trabalhadores e o Estado. Essas relações são marcadas por um profundo desprezo e desejo que a classe dominante (burguesia e alta cúpula de Estado) nutre de subtração, submissão e eliminação do povo, maioria composta por trabalhadoras e trabalhadores pobres, pretos, indígenas e periféricos. Nesse sentido, o Bolsonarismo é a expressão dos desejos, dos interesses e das práticas da classe dominante e de uma parcela de algumas frações da classe trabalhadora que compactua com uma política da morte, do genocídio, que é conservadora, e que tem como espelho para seu modo de vida os dominantes.

A situação da crise da saúde pública no Brasil é agravada pela crise política que começou com o Golpe institucional dado no governo Dilma/PT e a ruptura entre PT e o PMBD, em 2015. Há uma fissura no campo da direita que vem se expressando na luta pelo controle das principais instituições estatais e na condução da política de Estado, sendo a demissão do Ministro da Saúde Mandetta, e renúncia do Ministro da justiça Sergio Moro, auge dessa crise. No primeiro caso, o conflito se deu em torno da própria existência do Estado e do seu papel de manutenção da ordem diante uma crise com efeitos deletérios, e também do alinhamento com uma política sanitária de ordenamento global. No segundo, a tentativa de controle sobre aparato policial e judiciário pelos bolsonaristas, mais especificamente a interferência na autonomia da Polícia Federal. O arranjo político pós-eleitoral que resultou na unificação do centrão com a direita baseado no consenso em torno da acentuação da política do desmonte da seguridade e proteção social e do trabalhador, através de reformas da previdência e trabalhistas, está ruindo. De um lado, o centro-direita liberal e de outro os setores ultraliberais e neofascista. Essa fissura se dá entre uma necropolítica e outra liberal conservadora que tenta em algum nível manter a ilusão em torno da possibilidade de um estado democrático numa economia capitalista. No entanto, não há desacordo na adoção de medidas econômicas de combate a pandemia que salvará burguesia e deixaram a conta para os trabalhadores pagarem.

Do ponto de vista político ainda temos um cenário que seria a efetiva integração das forças armadas com as milícias, dado a sustentação que toda família Bolsonaro vem tendo das FFAA, principalmente do Exército. É importante lembrar que o palácio do planalto é composto basicamente por militares, generais formados na ideologia anti-comunista dos EUA, anti-povo.

O atual cenário de crise traz um grande desafio às organizações dos trabalhadores que é exigir e garantir que a quarentena e os cuidados com a saúde pública se estendam a todas às trabalhadoras e trabalhadores da produção, serviços e comércios, os precarizados (informais) e as populações vulneráveis e carcerárias. O cuidado não pode ser seletivo apenas à parcela das trabalhadoras e trabalhadores da educação e cultura, servidores públicos e estudantes como vem acontecendo.

Além disso, precisamos nos organizar coletivamente para lutar por medidas de segurança e manutenção dos empregos e dos direitos durante e após a pandemia. Precisamos criar imediatamente formas de solidariedade e apoio mútuo entre nós trabalhadoras e trabalhadores, visando a construção de uma rende de solidariedade que ajudem os trabalhadores mais vulneráveis. Além disso, é preciso criar desde já experimentos de contrapoder para participação e orientação popular diante do fato de o Estado continuar sua política genocida.

Como apontamos na primeira nota que, num curto cenário, o mais provável seria que os governantes optassem para lidar com a crise econômica provocada pela pandemia por acentuar as medidas de austeridade, e aprofundassem as reformas que visam retirar direitos dos trabalhadores.  Isso ocorreu. Fora isso, a política de transferência de renda é insuficiente e burocrática, deixando uma parcela da população sem acesso ao auxílio emergencial, sofrendo com o risco de contaminação nas filas da Caixa Econômica, ou de fome.

A greve geral por tempo indeterminado não deve ser descartada como medida de prevenção à saúde de todas às trabalhadoras e todos os trabalhadores. Através desse método de luta do trabalhador que poderemos enfrentar o aprofundamento do pacote de austeridade, o aumento do desemprego e a retirada de direitos trabalhistas durante e após o controle da pandemia. Nesse sentido, os sindicatos, movimentos sociais, coletivos e centrais sindicais devem avaliar a possibilidade de convocação de uma greve geral por tempo indeterminado de todos os trabalhadores, como medida de segurança para evitar a circulação de pessoas, e criar uma pauta de reivindicação de proteção ao trabalhador em geral, e ao emprego durante e depois da pandemia. É urgente organizar pequenos comitês de saúde pública por local de trabalho, moradia e estudo para garantir a segurança à saúde e a defesa dos direitos e do emprego.

Nos serviços públicos os diferentes sindicatos devem exigir, em solidariedade, que, os técnico-administrativos e terceirizados sejam liberados do trabalho presencial tendo asseguradas as mesmas condições de segurança à saúde, os pagamentos dos salários e a manutenção do emprego. O efetivo mínimo que permanecer trabalhando deve ter garantia de acesso aos equipamentos de segurança (luvas, máscaras, álcool gel, sabonete, papel toalha e, quaisquer outros itens de proteção indicados pelas autoridades sanitárias).

Defendemos como principais medidas:

  • Paralisação imediata da produção e serviços, mantendo apenas os essenciais (supermercados, farmácias etc), com jornada de trabalho reduzida e obrigação do patrão de fornecer todos itens de segurança;
  • Direcionamento de toda produção de alimentos para abastecimento do mercado interno;
  • Imediata revogação da EC-95 e aumento do investimento no setor público da saúde;
  • Aumento das equipes de agentes comunitários da saúde, defesa e aumento do número dos CAPS;
  • Confisco do lucro dos acionistas e reversão dos recursos para os setores da saúde pública e para políticas de geração de emprego e renda;
  • Pagamento dos salários e garantia da manutenção dos salários e dos empregos durante e após quarentena;
  • Liberação dos empregados domésticos e diaristas das atividades com pagamentos dos salários e diárias;
  • Renda mínima acima de 2 salários para todas às trabalhadoras e os trabalhadores precarizados (informais), garantido as necessidades básicas;
  • As medidas de proteção à saúde devem ser estendia à população carcerária e às populações mais vulneráveis.
  • O sistema privado de saúde deve disponibilizar sua estrutura e recursos humanos para atender a população como todo e não apenas os segurados.
  • Congelamento dos preços de artigos de limpeza e álcool gel e da cesta básica, aluguéis e planos de saúde, bem como a limitação do consumo de artigos de higiene por pessoa, dando prioridade às pessoas que integram os grupos de riscos.

 

GREVE GERAL PELA SAÚDE DAS TRABALHADORAS E TRABALHADORES!!!

A VIDA É MAIS IMPORTANTE QUE O CAPITAL!!

Saudações Sindicais,

ADCEFET-RJ – Seção Sindical do ANDES – SN – Gestão Ação e Participação 2019-2021

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